Todos nós que podemos estar envolvidos de alguma forma com alguma escola devemos nos sentir privilegiados.
Muita gente deseja mudar o mundo. Mas não existe um lugar melhor pra começar a mudá-lo do que em uma escola.
Podem até dizer que hoje, no vale do silício, ou em outros polos de inovação, estão sendo planejadas as grandes transformações dos próximos anos.
É verdade que muitas dessas tecnologias e inovações mudam a forma como nos relacionamos, comunicamos e vivemos. No entanto, sem mudar os valores humanos, nenhuma mudança é significativamente boa para mudar de verdade o mundo.
Em uma escola, essa transformação é possível.
Indisciplina pode virar foco, raiva virar garra, frustração virar alegria, dificuldade virar crescimento, carência virar amor.
Portanto, estando nós em uma escola, nunca vamos perder o sonho de deixar um futuro melhor. De formarmos nas instituições adultos melhores, com mais inteligência emocional, mais humanos e sensíveis a tudo que o mundo precisa.
Podemos continuar achando que isso não tem nada a ver com a gente. Que nossa função é ensinar equações e gramática, entre outras disciplinas, e nada mais.
Mas propomos uma crença diferença, a de que somos realmente responsáveis e capazes de gerar mudanças verdadeiras na sociedade.
Uma escola sem sonhos está morta. A parte boa é que ela pode sempre renascer…
A tristeza está aumentando entre os jovens
Segundo a OMS, em 20 anos a depressão deve se tornar a doença mais comum do mundo.
Em entrevista à Veja, Saul Cypel, membro do departamento de Pediatria do Comportamento e Desenvolvimento da Sociedade Brasileira de Pediatria, diz que o número de crianças com transtornos psicológicos subiu muito.
Nos últimos 10 anos, segundo Cypel, houve uma transformação do perfil da clínica: se antes as queixas sobre o comportamento infantil correspondiam a 20% dos pacientes, agora são responsáveis por 85% do total de seu consultório de neurologia.
Mais do que infelizes, as crianças brasileiras também estão ansiosas, estressadas, deprimidas e sobrecarregadas.
“Elas estão desconfortáveis com a infância. Esse desconforto aparece de várias formas: como irritabilidade, desatenção, tristeza e falta de ânimo. Muitas vezes, é um comportamento incomum em relação à idade delas”, diz Ivete Gattás, coordenadora da Unidade de Psiquiatria da Infância e Adolescência da Unifesp.

Estamos enxugando o gelo enquanto ele derrete
De que adianta educarmos as crianças para o futuro, elas se tornarem excelentes profissionais em suas áreas, mas serem infelizes?
De que adianta se se tornassem adultos com muito dinheiro, mas incapazes de lidar com suas emoções e terem tranquilidade na vida?
De que adianta serem cada vez mais produtivos e capazes de lidar com as tecnologias mais complexas, se como adolescentes ou adultos não se sentem realizados?
Em três anos, o número de atendimento do SUS a jovens com depressão subiu 115% e, apesar da carência de números, diversos especialistas mostram-se assustados com o crescimento de doença como depressão e ansiedade entre os jovens.
O psiquiatra e escritor Augusto Cury tem uma tese forte, de que as crianças de famílias de classe média, classe média-alta e classe ricas estão sendo escravizadas.
Milhões de famílias colocam seus filhos em tantas atividades que eles não têm mais tempo para serem crianças.
“Uma criança de sete anos tem mais informações que um imperador romano. Isso não é suportável, esgota o cérebro”.
Que educadores são esses que se contentam com essa realidade? Vamos continuar fingindo que não tem nada a ver conosco?
Que pais são esses que não fazem nada para mudar essa realidade? Estão ocupados demais trabalhando, ganhando dinheiro e com a consciência limpa porque estão investindo muito no futuro dos filhos?
Talvez seja hora de lembrá-los que filhos não são um tipo de ativo de renda fixa que se investe dinheiro e o retorno vem com o tempo. Trata-se de algo muito mais complexo.
Se formos resumir bem em uma frase: este ativo precisa de tempo de qualidade junto dos pais, de amor e atenção por parte da família, e de uma escola que o deixe livre, não pressionado contra a parede.
Primeiro, vamos alinhar as expectativas
Vamos lá, vamos sentar com esses pais. É realmente isso que eles querem?
Acham que tratando os filhos como máquinas de aprender idiomas,esportes, dança, entre outras atividade, vai resolver?
Acham que baixar o app da escola, de vez em quando e olhar o que está acontecendo – mas nunca conversar com as crianças sobre a educação – é suficiente?
Acreditam que devem continuar cobrando que as escolas preparem os alunos para o vestibular?
Vamos continuar com esse modelo de ensino se nem sabemos quais serão as profissões do futuro?
Até quando vamos nos sentir confortáveis neste modelo de escola que fracassa continuamente?
Provocar não é pecado. Aliás, só não faz isso quem está deitado na zona de conforto, o que creio não ser o caso de quem está lendo este texto.
Portanto, busque a discussão com as famílias sobre esses assuntos, busquem juntos soluções em comum e comecemos a nos mover em uma outra direção.
Comece pela comunicação
Se você gritar, ninguém vai te ouvir. Se você desenvolver bem seus argumentos, suas ideias e raciocínio, ficará bem mais fácil.
Se conversar, dialogar e procurar ajudar de verdade, os pais podem parar para te escutar.
Se você quer mudar o rumo da sua escola, ir além do esperado, tudo começa pela comunicação.
Sem alinhar as expectativas, sem ter claro na mente de todos os colaboradores qual deve ser o foco, tudo não passa de ideias e os sonhos não saem do papel.
Além da comunicação interna, ter um canal de diálogo com as famílias é essencial para fortalecer a parceria. Tudo que o aluno faz na escola é reflexo do que ele vive em casa, logo, se começa a ser parceiro de verdade dos pais na educação, tudo fica mais fácil.
Com boa capacidade de comunicação, você pode ajudar os pais a mudarem o foco de suas ações e prioridades.
É sonhar baixo demais agir de forma reativa a tudo que os pais pedem. Buscar conscientizar e educar os pais para atuarem de forma conjunta à escola na educação é o que vai te trazer os melhores resultados.
Escola nesta era, afinal, não é sobre apenas ensinar os alunos. É sobre educar também os pais e nós mesmos, para lidarmos com as mudanças que acontecem em velocidades cada vez maiores.
Estando conscientes disso, seremos melhores, com certeza.
Como ajudar as crianças e jovens a desenvolverem inteligência emocional?
Este é um trabalho que depende muito da família, por isso a importância da parceria com a escola, que se torna maior quando a escola tem uma comunicação efetiva.
Daniel Goleman, jornalista científico americano, traz vários ensinamentos em seu livro Inteligência Emocional.
Uma criança com inteligência emocional alcança muitas vantagens, como maior autoestima, capacidade de comunicação, resiliência e autonomia.
As crianças precisam da presença dos pais, para que tenham um desenvolvimento saudável da emoção.
Principalmente nos anos iniciais, o tempo de qualidade que a criança passa com a mãe e o pai faz toda a diferença.
No dia a dia, os pais devem incentivar que seus filhos falem sobre seus sentimentos e que mostrem, sem timidez, o que estão sentindo.
Além disso, o exemplo que os pais dão no convívio diário é parte essencial para a construção da inteligência emocional. Eles devem demonstrar gentileza e equilíbrio em suas ações, se querem que os filhos tenham um bom comportamento.
Permitir que as crianças expressem também suas habilidades por meio das artes: música, esportes, dança, etc, é algo extremamente positivo.
Essas atividades ajudam na descoberta do mundo e também das próprias emoções.

Ensine as crianças a lidarem com as frustrações e terem empatia
Muitas vezes, os pais têm uma natureza protetora e não querem deixar que seus filhos se frustrem. No entanto, isso acaba sendo um tiro no pé, já que não deixar que as crianças e os jovens falhem deixam eles despreparados para o mundo real.
Na vida real, falhamos, erramos e nos frustramos e precisamos saber como lidar com isso.
Neste caso, é bom fazermos uma analogia com o esporte. É como qualquer atleta de alto nível. A maior parte deles perde mais do que ganha, no entanto, não deixam de serem incríveis por isso.
Dê apoio aos alunos para que eles entendam que nem sempre vão vencer e que precisarão lidar bem com isso.
Além disso, é importante fazer com que os alunos se coloquem no lugar do outro. Sem essa habilidade, eles podem ter comportamentos errados. O exercício de empatia ajudará a evitar o bullying no ambiente escolar.
Tente mostrar para as crianças como uma criança que sofre bullying sente e como isso afeta a vida dela.
Um bom filme para exemplificar isso é Extraordinário, que conta a história de um garoto que sofre muito na escola por ter uma deformação em seu rosto.
Com empatia, os alunos aprenderão a ter mais compaixão pelo próximo e serão mais fáceis de conviver, além de mais generosos.
Lembre-se de tentar entender a perspectiva do outro
João estava agressivo em sala de aula. Já tinha brigado com dois colegas e demonstrava muita agitação em sala de aula.
Ele tinha raiva no olhar e passava sentimentos ruins em quase todas suas interações na escola.
Quando chamado atenção, respondia de forma grosseira.
A primeira tentação é reagir de forma veemente e buscar uma punição, pra ver se ele muda o comportamento.
Era impossível ter alguma empatia com aquele garoto, o seu comportamento era inexplicável.
Mas a professora, capaz e disposta a realmente entender a perspectiva do outro, buscou mais informações.
Ela descobriu que o garoto via, já há alguns meses, seu pai bater em sua mãe. Seu pai, alcóolatra, o xingava e o ameaçava enquanto agredia a pessoa que ele mais amava.
O que você seria se visse uma situação dessas, com muita frequência, com apenas 10 anos de idade. Não temos essa capacidade de julgar. Mas o mínimo que poderíamos ter seria ter compaixão por você.
Essa história, real em muitos lares, é realmente muito triste e nos mostra que às vezes comportamentos errados não vem por acaso. E que podemos, de alguma forma, ajudar a quebrar este ciclo negativo.
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Conclusão
Nas escolas, podemos fazer muita coisa para ajudarmos a conter este problema. O que devemos evitar, de fato, é a indiferença.
O protagonismo da educação emocional, de fato, está nas mãos das famílias. No entanto, a escola tem importante papel de conscientização e apoio aos familiares.
Se a escola hoje pode atuar como uma mídia, devido as inovações tecnológicas que facilitam muito a comunicação com as famílias, ela deve usar toda a sua sabedoria para ajudar os pais e alunos a viverem uma vida melhor.
A felicidade deve estar em pauta. Até porque ajudar os outros a serem felizes permite algo mágico: fazer a gente feliz também.
Não dá mais para termos um sistema de ensino engessado em que não falamos de nossos sentimentos. Somos humanos, e esperamos que sua escola seja cada dia mais humana para que todos que fazem parte dela se sintam mais realizados.
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